Da Violência
Alguns séculos de existência e a mania incessante de negar
as guerras. Levantes, revoltas e inquietações firmam nossa trivial capacidade
de fazer-nos humanos. Há quem reflita-se pacífico. Há os que se consideram
pacatos e sossegados. Ilusão. Útil equívoco aos labirintos da mente, que frente
ao caos, lamenta-se por fazer parte das catástrofes. As reclamações frente ao
vizinho, as queixas ao taxista e a indignação com a política, com a segurança,
são métodos práticos de encenarmos a paz que jamais praticamos. Somos o que
Hobbes considerou os lobos de nós mesmos, e temos incrível tendência ao ódio,
ao crime e à violência. Sem o problema, não havemos. Sem a hostilidade e seu
frenesi, não somos mais do que espectadores infelizes de uma peça vazia,
desprovida de luzes e ausente dos atores.
Manifestações
de repúdio, atos indiretos de cidadania. O ódio ao ódio é o que nos sobra
enquanto habitantes das cidades, das vilas, da internet e dos círculos sociais.
Bradamos contra a morte, protestamos a favor de uma paz que não sabemos do que
se trata. Criamos a imprensa e a imprensa nos criou. Testemunhas diárias de
suas tragédias, ouvintes assíduos de confusões que nem bem existem. O
jornalismo, a publicidade, são homens enganando homens, que por sua vez, pensam
enganar outros homens, mendicantes, estéreis sociais e fracos. E o círculo
fecha-se como maldição. Os desprovidos, violentos e sedentos pela nova
fatalidade, somos nós. O criador educado pela cria. O público ávido, que espera
sentado os novos assaltos e as novas trapaças, que torna-se saborosa e
nutritiva, quando ocorre próxima, mas não tão próxima que a nós atinja
diretamente.
2 Comments:
Um ensaio pequeno e forte. Curti.
Sempre ótimo! Entro na internet, abro meus e-mails e venho até O Soco.
Postar um comentário
<< Home