quarta-feira, março 03, 2021

Eu quero ir, minha gente

Eu não sou daqui

Eu não tenho nada

Quero ver Catarina e Ana Luiza rirem.

Quero ver Catarina e Ana Luiza

darem suas risadas


Por entre o itinerário da vida, fizeram-me assim algumas mulheres. Fêmeos verões e invernos feminais, talvez tenham-me presenteado com a assiduidade afetiva e graciosa de grandes avós, audaciosa mãe, inspiradoras irmãs e encantadoras amantes. Não as esqueço por um minuto. O toque de suas mãos e o inconfundível aprimoramento com que sua feminilidade decorava meu requisito evidente e descomplicado: ter nascido um garoto. Inteligível e espontâneo, parece que aos meninos, também de forma arbitrária e tirânica, sobra a simplicidade de uma existência masculina. Corriqueiramente masculina. Encarregar-se de certa praticidade e pouco das aflições da alma. Ocupar-se da sisudez e raramente da poesia. Atender ao instinto e desaprender o afeto, segregar a delicadeza. 


O hábito de viver sem perceber à volta, pode esconder epidemias talvez mais violentas e avassaladoras do que um vírus. O fruto da imperícia afetiva ou da masculinidade confusa, que já nem sabe mais o que fazer frente aos próprios desalinhos, é nitidamente o princípio de uma geração abalada. Mulheres maduras, moças e garotas, traumatizadas por vínculos e relações inseguras, maternais, abusivas, violentas ou fracas. A crise sentimental e cultural do homem é agente imprescindível para que uma multidão de mulheres esbarre em vândalas paixões, devastadores envolvimentos e laços perturbadores. O medo de uma nova investida, a hesitação patológica em um novo romance, e por vezes, a desistência de construir aquilo que nós humanos, tanto amamos. Comer, rezar e amar… Não necessariamente nessa ordem, torna-se atividade incerta, suspeita e arriscada. O que se pode comer? De que forma devemos rezar? E o mais comovente: será que amar não é perigoso demais? 


Notoriamente sobra a algumas mulheres a capacidade de abstrair. Qualquer sensatez lotada de maturidade, capaz de deixá-las soberanas, desamarradas e disponíveis ao amor e ao gozo. O beijo que talvez não signifique ameaça, e o convite que tampouco pareça a fenda para um forte e estúpido golpe. Mas não havemos aqui de julgar ou categorizar personalidades e, principalmente louváveis técnicas de assimilar abusos e lágrimas. Mulheres são diferentes. Assim como as pedras. Assim como as mariposas. Somos incompetências e talentos, desgraças e glórias, noites e dias. Jamais sobreviveríamos se a existência nos desse a placidez e a mansidão de uma calma inanimada. O que parece gritante é que a mesma geração comprometida com mudanças necessárias e consciente de uma renovação humana, degusta durante boa parte da vida, o impacto e o trauma de uma relação vexatória, solitária, desonesta ou enganosa. 


Das mulheres que me tiram o sono, duas são garotas felizes, lindas e mágicas. Ana Luiza e Catarina querem amar, e não querem traumas. Que jamais o mundo lhes proteja dos infortúnios, das decepções e das lágrimas. Reles foi o que aprendi sorrindo. Que suas vidas estejam em perfeito equilíbrio entre o caos do pensamento, as dores da existência e a explosão dos orgasmos e dos sorrisos que não cessam. Mas que pela imprudência da boçalidade e pela maldade do egoísmo viril, jamais deixem de querer florir as paixões e entregar-se ao amor, por medo de um certeiro sofrimento trivial. 


Que até os galhos possam mudar. Que tampouco as pedras permaneçam iguais. Mas que, principalmente, os homens compreendam sua vergonhosa fragilidade. Os tempos não parecem propícios, e a brutalidade nos sufoca a cada despertar do relógio. O homem é cada dia mais tolo. E a cada dia parece orgulhar-se mais de sua tolice. 


Por Ana Luiza, por Catarina, por todas as mulheres, e pasmem, por nós homens: "quem sabe o super-homem venha nos restituir a glória, mudando como um deus o curso da história. Por causa da mulher"