sábado, fevereiro 03, 2007

O poema que foi

Foto: uma menina chamada Lisiane.
O milagre, sujo,
Tenta enganar o poema.
Que agora, em sua chegada,
Faz-me digno dele.
Canta o fato natural da alma humana,
Sob a pele nua.
O corpo todo respirando,
Entre flores e prédios.
De olhos abertos, inconscientes.

Assassino! Assassino!
Diz-me o poema,
Que cai dentre as sombras dos relógios.
Morre de velho, o pobre!
Com cheiro de morte.
Por ser tão moço.

Ah, poema,
Que só me vens assim com palavras tolas.
Volte, ò soneto de amor!
Para uma linda moça de rua.
Para uma senhora, nua.
Uma menina que passa.
Volte soneto apaixonado.
Dos tempos em que sentava na praça.
E, ao meu lado,
Só um caderninho escrito.
Um passarinho descansado,
E um olhar em forma de grito.


Jonas Lewis




sexta-feira, fevereiro 02, 2007

Um soco no peito


Os segundos são fumaça.
Trazem dor aos olhos
Cansados de tanto enxergar.
Prédios altos, baixos e pretos,
Barulho de nada, às vezes de tudo.
Com sedas por volta,
Todas coloridas
E que ninguém vê.
Ninguém nem sabe que existe.

O tempo mata e nunca morre.
O tempo engasga o pólen na garganta.
O tempo abaixa com o pau,
E estampa-se em relógios inúteis.
Os ponteiros são a morte,
Não pedem licença,
Giram feito cata-vento
Mas nunca alegram a criança.
Que sempre apodrece deitada nas horas.

E os peitos da multidão,
Pobre multidão sofrida.
Derramam o leite verde pelas calçadas.
Com seus duros mamilos marrons,
Com gosto de tinta fresca.
E apoiados nas roupas feias da moda,
Desfilam o ódio em forma de existência.
Querem o que não é seu,
E se conseguem, gargalham dos Pardais de Peito-Estufa.

Nos Castelos Brancos nada fede.
Nos Castelos Brancos tudo reluz.
Lá não há choro que cubra o rosto,
Nem sorriso que o alongue.
Lá é um Castelo Branco, e só.
Tem água limpa, suja, à escolha.
E sempre uma palavra tola,
Bela palavra tola, que descansa o ser.
E uma nuvem em cima das camas,
Que chove sem pensar em parar.

Querer a resposta do estímulo de Deus,
Faz-nos perguntas de mendigos burros.
Receber o início das profundezas do pensamento,
E tecer o final conforme a vontade própria.
E no vômito da solidão,
Onde os pássaros não voam nem passam,
Descobre-se a esmola dentro do bolso.
E como uma miniatura de mundo,
Visto minhas calças e saio pra rua,
Em busca de um pouco de mim.


Jonas Lewis da Costa Franco

O que tenho




Ah, a angústia de esperar-te

Em vão, sem que apareças.

De notar-te sem vontade de ver-me

De saber enfim que não te tenho

Nem terei.

Por que me deixas no chão?

Pobre, sem respostas

Porque finge que gostas

E prepara-me o coração?

Responda-me num olhar somente

Desses que mata ou revive

A esperança da gente.

Depois de mostrar-te o que talvez sou

Que posso ter o que não terás.

De um outro qualquer que amaste

E esperaste o que ele nunca traz.

De mim, foges.

Como quem tem medo.

Deixe de tolice mulher!

Que o que tenho pra ti é amor

Desses que qualquer uma quer

Lotado de graça e de cor.

Venha, pra mim, diga-me: eu vou

Que te espero até o dia partir.

Mas se ele acaba e vejo que acabou

Posso no final desistir.